sábado, 4 de dezembro de 2010

As Sutilezas do Primeiro Turno


Levi Machado de Oliveira

Faltando pouco mais de uma semana para o primeiro turno, dava-se como resolvida a eleição presidencial. A rigor mesmo, nem a oposição acreditava numa segunda etapa. Então aconteceu a ascensão da candidatura Marina Silva, e deu no que deu. Muitas perguntas sobre que fatores determinaram o segundo turno podem ser feitas. As respostas serão variadas, conforme o interlocutor. Poucas hão de tocar no tema fundamental. Os atores principais da contenda eleitoral, por razões óbvias, preferem não comentar. Dirão alguns que o esforço de setores poderosos da mídia com foco numa alegada violação de sigilo fiscal de parentes do candidato tucano serviu para estancar a queda deste e para frear o crescimento da adversária. Outros, que maior impacto teve o viés religioso dado a temas como descriminalização do aborto e união civil homossexual, para expor uma suposta diferença de opinião entre os dois. Uma terceira corrente, majoritária ao que parece, atribuirá o fato às denúncias que abateram a ministra Erenice, da Casa Civil. Usados pelo oponente principal ou manipulados em seu favor, sempre de forma muito bem dissimulada, esses expedientes, e outros que permearam o submundo da internet e o sermão de padres e pastores amestrados, influenciaram sim, de algum modo, o andamento da campanha eleitoral. Parece certo, no entanto, que à exceção do episódio envolvendo a Casa Civil, nenhum dos demais impactou de verdade a campanha de Dilma Rousseff. E é provável que o objetivo central do esforço insidioso montado em torno desses assuntos tenha sido o de desviar a campanha do eixo fundamental imposto pela situação, com efeito baseado na comparação entre o atual governo e aquele que o precedeu. Não sendo possível contestar as melhorias e avanços na área social – a mais sensível eleitoralmente – nem associar-se a eles, como a princípio se tentou, era preciso oferecer algo mais que causasse a impressão de uma possível continuidade com vantagens adicionais. Para que isso fosse assimilável, era preciso afetar a credibilidade e a imagem da candidata, sem agressões ao seu maior cabo eleitoral – o presidente Lula, condutor de um governo com índices de aprovação nunca vistos na história do Brasil. Restou ao candidato do patriarcado paulista a alternativa de desvincular o Presidente da candidata de sua escolha. Para que ela parecesse incapaz e incapacitada para a condução de um governo de continuidade. Esperava-se a princípio, e isso era largamente difundido, que a candidatura de Dilma Rousseff viesse a naufragar com a comparação de currículos, experiências e trajetórias eleitorais. Não deu certo. Não colou. A mulher surpreendeu. Sua campanha foi melhor que a do principal oponente, nos programas eleitorais e nos debates. Por algum tempo, o tucanato chegou mesmo a ficar desnorteado. Voltou a ganhar fôlego com a estratégia do ódio e do preconceito, traduzida em ataques à honra e dignidade pessoais da candidata lulista. A campanha suja a princípio deu o resultado esperado. Permitiu a preparação do terreno para propostas inusitadas, nunca antes presentes no receituário neoliberal de tucanos e demos. Em outro contexto, no percurso de uma campanha normal, eles mesmos denunciariam, como puro e simples desatino, promessas como aumento do salário mínimo para 600 reais, de 10% para aposentadorias e de 13º salário para a bolsa família. Diriam que nunca antes alguém se atrevera a tanto. Ao mais absoluto e descarado desafio aos fundamentos da lei de responsabilidade fiscal. Na falta de reação dos setores interessados – organizações empresariais, prefeitos e governadores –, talvez até pela certeza de que não passavam de pura e barata demagogia, essas promessas acabaram por mexer com o seguimento social a que estavam, de fato, destinadas. Muitos eleitores de baixa renda e aposentados, embora amplamente favorecidos no governo Lula, passaram a acreditar nas mensagens populistas do candidato tucano. Que não esperava, por certo, a reação silenciosa de setores da classe média. Nesse ambiente ocorreu um movimento reverso. Eleitores afortunados, ideologicamente mais simpáticos ao discurso oposicionista, percebendo o engodo, a irracionalidade das promessas serristas, resolveram dar tempo ao tempo, transferindo o voto para Marina Silva.
Levi Machado de Oliveira é advogado.
Fonte:24 horasnews

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